quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Guasqueiros

Imaginem aqueles dias de chuva torrencial e ininterruptas numa cidade. Pessoal se queixando do tempo, "mas pra quê tanta chuva?", "as roupas sempre encharcadas", as reclamações são muitas. Porém, se olharmos para o céu e o verde que ainda têm em nossa cidade, perceberemos a importância da simbiose clima-terra, e principalmente, uma paciência espontânea brotará em nós, ao contemplarmos a criação pura de Deus. Com o templo, contemplar, talvez venha daí, estar com o templo, da natureza, dos campos, dos rios, dos bichos, das flores, do mato, do céu. Pode ser, estarmos com o templo, é estarmos contemplando alguma coisa, bela, que nos tenha significado. Pena os homens fragmentarem a pureza da vida, a verdade que a natureza, ou Deus, ou a luz do cosmo nos oferta a cada dia.
Bueno indiada, pero vim aqui falar da contemplação dos dias de chuva, e justamente nesta atitude do homem perante à natureza é que se encontram os guasqueiros.
Sim, chegamos ao título proposto aqui neste artigo. Nos dias de chuva na campanha, no campo, o trabalho nas invernadas com o gado, numa lida de mangueira, ou na lavoura é praticamente inviável. Nesses dias de chuva constante, quando São Pedro abre "a bica lá de riba", o pessoal da Estância, um peão-caseiro, um campeiro, um domador, se torna também um guasqueiro. Com a água encharcando o campo, resta aos campeiros se aquerenciarem no galpão e darem de mão em alguns tentos (pedaços de couro cru) que ficam pendurados num canto curtindo, para serem artesanados especialmente neste dias. Deste trabalho artesanal com o couro, nascem rédeas, buçais, cabrestos, cintos ou rastras, cinchas, laços, rebenques ou mangos, até mesmo chaveiros e outros regalos que a imaginação do artesão tenha alcance. À este trabalho com o couro, os tentos, ou conhecida tmabém como guasca, é que se deriva o nome de guasqueiro ao seu trabalhador. Artesãos do couro, dos aperos, que ao contemplarem esses dias de chuva, recolhem a pureza do campo para o seu trabalho. Talvez seja por isso que ficamos contemplando tanto, uma peça realizada por um guasqueiro, por um campeiro. "Bah, aquele buçal", ou então "que rastra feita a preceito!", também "este freio foi feito pra o meu gateado!".
Mesmo quem é da cidade, se "queda" a admirar toda a aquela paciência templada com mãos e couros, restos de vida num fundo de campo, que se renovam na paciência, na contemplação, na sabedoria de estar com o tempo, com o templo, com a vida, de ser simplesmente um guasqueiro... E ainda têm muitos que pensam, que acompanhar o tempo é estar atualizado nas tecnologias forjadas por outras máquinas, sem alma, sem tempo!

Aos guasqueiros da Pampa Gaucha, e aos meus estimados amigos e leitores que tiverem a paciência de cevar um mate neste blog, tem um video lindo abaixo, uma homenagem aos que cultivam com amor sua alma e sentimento. O inigualável Jari Terres, cantor criollo da terra gaucha Sudamericana, canta no Festival da Galponeira em Bagé, tema do Otávio Severo, Rafael Xavier e Zé Renato Daudt, "Mulato Guasqueiro".

Em tempo: um abraço aos amigos Silvério Barcellos e André Teixeira, músicos que acompanham o Jari, além do Loco Bender e do Giovane Marques.

Nenhum comentário:

Postar um comentário